Como Inovadores e Organizações Podem Lidar com as Incertezas?

O momento quando um inovador e uma organização apresentam sua invenção a um mercado em crescimento, interessado em comprá-la, é incrivelmente intenso. É também um momento cheio de incertezas. O produto terá sucesso? Alguém vai comprar? Será um ‘hit’? Num ambiente estável, esta incerteza centra-se principalmente na adequação do produto ao mercado. No entanto, ao longo dos últimos anos, parece haver uma crescente instabilidade global. Esteja o inventor no Brasil ou no Canadá, a pandemia de Covid-19 mudou as formas de trabalho e de comunicação. Os países estão lutando com condições econômicas instáveis pós-pandêmicas, com alta inflação e altas taxas de juros. Na frente política, houve a manutenção de governos populistas e autoritários, incluindo opressão de minorias e até mesmo guerras. Finalmente, há uma onda de mobilidade global de talentos, pois os países competem não apenas por recursos físicos e financeiros, mas também por capital humano, como imigrantes altamente qualificados. Essas questões exógenas têm um efeito exponencial durante os momentos mais incertos da validação do produto: seu lançamento e sua expansão. Gostaríamos de falar sobre como inovadores e organizações podem lidar com essa incerteza criando um ciclo de comunicação (hype) sustentável e capitalizando os fluxos globais de conhecimento.

Lançamento e expansão do produto

O ciclo hype de Gartner representa graficamente a curva de comunicação das novas tecnologias, dividindo-a em cinco fases sequenciais: gatilho de inovação, pico de expectativas infladas, vale da desilusão, rampa de esclarecimento e platô de produtividade. Ao lançar um novo produto, atenção, empolgação e expectativas devem ser criadas em mercados potenciais. É da natureza humana ser atraído pela novidade e querer fazer parte das últimas tendências. O desenvolvimento do hype começa com um estágio de expectativas elevadas, pois os atores procuram persuadir um público maior da certeza de sua invenção e, ao fazê-lo, mantêm um forte senso de controle sobre seu lançamento. Esse exagero cria um hype insustentável e o público passa a um estágio de desilusão. Da ‘Mania das Tulipas’ na Holanda de meados do século XVII, à bolha das empresas ponto com dos anos 1990, o hype criou uma bolha especulativa que implodiu. Esse declínio aparentemente inevitável no ciclo hype pode ser evitado, ou pelo menos significativamente reduzido, por meio de práticas que forneçam alguma prova social de que a invenção pode corresponder ao hype. Os inovadores podem estar ativamente envolvidos na geração de provas, continuando a contar sua história e construindo uma cultura em torno da inovação. No entanto, os empreendedores costumam usar heurísticas ou atalhos mentais ao tomar decisões e isso cria uma propensão a exagerar o potencial de uma tecnologia. Quanto mais os inovadores envolverem terceiros no desenvolvimento e lançamento do produto, maior a probabilidade de seu produto atender às expectativas do mercado e criar legitimidade.

A propensão de inovadores e organizações de “se apaixonarem” por uma inovação é um fenômeno amplamente conhecido. Sua origem está relacionada a processos cognitivos que distorcem a forma como os inovadores avaliam o contexto. A percepção seletiva de estímulos é um processo inconsciente que faz com que o indivíduo apreenda informações que confirmem suas crenças e descarte informações que questionem suas crenças. Para inovações esse processo pode ser muito perigoso, pois o sucesso no desenvolvimento e lançamento de novos produtos depende muito de uma comunicação efetiva com potenciais consumidores e mercados. Os inovadores, assim como as organizações, devem evitar esse erro estabelecendo um ambiente que promova uma imagem realista de suas inovações.

Lidando com a Incerteza e o Hype

As carreiras do século XXI refletem o aumento da mobilidade e personalização para atender aos requisitos individuais. Os indivíduos planejam sua carreira com base no desenvolvimento de competências e na aquisição de conhecimentos. Os gestores devem estar atentos aos recursos de que dispõem e devem compreender o potencial de inovação que existe em um ambiente onde o conhecimento circula ativamente. Em um momento de incerteza, há uma expectativa, e até necessidade, de que os funcionários de qualquer empresa assumam uma ampla gama de funções, e isso pode e deve ser estendido para incluir uma consideração holística de suas experiências, cultura, idioma e redes. Ao envolver de forma abrangente funcionárioschave no início do desenvolvimento e expansão de um produto, os inovadores terão acesso a informações do mercado global que podem ajudar a controlar algumas incertezas. Isso permitirá que os inovadores tenham acesso a conhecimentos que podem reduzir suas distorções de percepção, facilitando o entendimento das necessidades, expectativas e comportamentos do consumidor.

A inovação reside na aplicação do conhecimento, cuja natureza é intrinsecamente dinâmica, fluida e móvel. Um ambiente altamente conectado pela tecnologia da informação é um cenário particularmente fértil para a inovação. O desenvolvimento tecnológico está promovendo um fluxo crescente de talentos (fisicamente) e circulação de ‘cérebros’ (física e virtualmente), criando assim um contexto propício ao desenvolvimento de inovações incrementais e radicais.

Esse fluxo de talentos está aumentando a diversidade na força de trabalho em um contexto global. Em todo o mundo, um número crescente de organizações contrata funcionários de diferentes países, com formações, idiomas, culturas e experiências variadas. Este contexto possibilita a circulação significativa de informações, e deve ser fomentado por inovadores e organizações, pois tem o potencial de funcionar como um círculo virtuoso, com a tecnologia promovendo e apoiando a circulação do conhecimento e da mesma forma, com a circulação do conhecimento promovendo e apoiando o desenvolvimento tecnológico.

Numa época de intensa inovação, os fluxos globais de talentos e a circulação global de conhecimento associada podem gerar conhecimento para inovadores e organizações, que os ajudaram a lidar melhor com a incerteza associada às fases de lançamento e expansão de produtos e, consequentemente, a sustentar o ciclo hype de inovação.

Profa. Dra. Francine Schlosser
University of Windsor
fschloss@uwindsor.ca

Profa. Dra. Marcia Carvalho de Azevedo
Universidade Federal de São Paulo
marcia.azevedo@unifesp.br


Leitura Adicional:

Azevedo, M. C. (2023). Preventing Brain Drain: A Sustainable Perspective of Global Talent Management, in Global Talent Management during Times of Uncertainty (2023). Eds. Schlosser, F and McPhee, D. New Yourk: Emerald Publishing Limited.
Logue, D., & Grimes, M. G. (2022). Living up to the Hype: How New Ventures Manage the Resource and Liability of Future-Oriented Visions within the Nascent Market of Impact Investing. Academy of Management Journal, 65(3), 1055–1082.
Schlosser, F., & McPhee, D. M. (2023). Global Talent Management during Times of Uncertainty (2023). New Yourk: Emerald Publishing Limited.

Comentários da carta

Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments
Mustache